É interessante observarmos como algumas palavras e expressões passam a ser mais utilizadas de acordo com determinadas circunstâncias. E foi justamente isso que acompanhamos diante da tragédia provocada pelas enchentes no Rio Grande do Sul, quando se falar sobre resiliência passou a ser parte quase que obrigatória nos mais variados discursos, seja de autoridades públicas, cientistas ou ambientalistas.
Quase sempre, abordam a necessidade de a gestão pública planejar estratégias de reconstrução que visem também a redução de vulnerabilidades, riscos e consequências, frente a possíveis novos eventos de semelhante magnitude. Embora seja um termo bastante empregado para descrever pessoas com grande capacidade de se reinventar, sobreviver às adversidades, ressuscitar, ressurgir das cinzas, com mais determinação, novos propósitos e significados, a resiliência é um conceito emergente também em outras frentes, como na arquitetura e na engenharia, com destaque para um novo modelo de planejamento urbano, criando ambientes mais acolhedores para que o homem e a natureza sigam se relacionando e se transformando constantemente.
Acredito que para pensar a resiliência no ambiente urbano, principalmente nas grandes cidades, caracterizadas por ampla densidade populacional, muitos problemas de mobilidade e avanço das construções irregulares, por exemplo, é preciso se planejar também novos modelos de convivência social, sobretudo nas áreas de educação e de cidadania. São ações ao alcance dos poderes públicos, que efetivamente poderiam resultar em cidades verdadeiramente capazes de se regenerarem.
Com a filosofia da consciência cidadã participativa transformadora, apresento a ideia de que temos a grande capacidade de mudar, nos adaptar e até mesmo de nos transformarmos, tornando qualquer circunstância em algo positivo, criando outras oportunidades, ressiginificando visões e propósitos. Para isso, é necessário desmistificarmos a ideia de que somos vítimas da sociedade, dependentes do Estado, e passarmos a buscar os caminhos para mudar a nossa cultura, os nossos hábitos. E isso envolve assumirmos o nosso “eu transformador”, o nosso “eu atitude”, o nosso “eu responsável”.
Assim como nos mobilizamos em amplas redes de apoio diante das grandes catástrofes, com investimento de recursos públicos e capital humano para promover a necessária reconstrução, precisamos também nos mobilizar para ampliar a inteligência cidadã, os sentimentos de pertencimento e unidade, capacitar a nossa sociedade para saber agir com racionalidade, com respeito a nossa Constituição Federal, promovendo a ordem e a recuperação da dignidade humana em seu conceito mais amplo. Assim, vamos promover a ressocialização da nossa sociedade, caminho seguro para escaparmos do caos social.
E como já venho apontando há algum tempo, a capacidade de resiliência, de ressocialização de qualquer comunidade ou até mesmo de nações inteiras, será sempre conduzida por uma minoria com conhecimento, com disponibilidade de tempo e até mesmo com recursos financeiros, através de campanhas que promovam educação cidadã, que ensinem nossos direitos e cobrem as obrigações do Estado, sempre respeitando as normas e as leis.
E acreditem, são geralmente aqueles que menos precisam dos serviços públicos como educação, saúde e moradia, os que mais podem contribuir com as nossas cidades, com os nossos estados, com o nosso país. A nossa participação é fundamental para o despertar da conscientização transformadora e da resiliência regeneradora.
Artigo escrito por Paulo Cavalcanti.